Chegam de diferentes partes do mundo sinais cada vez mais evidentes de que os
investimentos em fontes limpas e renováveis de energia vão modificando com
rapidez surpreendente a configuração da matriz energética. Durante o carnaval,
com o Brasil ainda sob o reinado de Momo, a Associação de Energia Eólica da
China informou que o vento ultrapassou em importância a energia nuclear naquele
país. Segundo o comunicado, em 2012 a geração eólica alcançou a marca de 100
bilhões de quilowatt-hora (Kwh) fazendo com que o vento assumisse a terceira
posição no ranking da matriz energética chinesa, atrás do carvão e da
hidroeletricidade. O objetivo do governo de Pequim é fazer com que a energia
eólica cresça mais de 50% até 2015.
Enquanto os chineses celebravam o feito, os norte-americanos comemoravam um
outro recorde: 2012 entrou para a história como o ano que os Estados Unidos
mais investiram em energia eólica. Com o acréscimo de 13,1GW de capacidade
instalada na rede (o vento foi a fonte de energia que mais cresceu ano passado
naquele país) o país evita a emissão de 96 milhões de toneladas de C02 por ano,
ou 1,8% das emissões totais. De acordo com a Associação de Energia Eólica dos
Estados Unidos, os aerogeradores já produzem energia suficiente para abastecer
14,7 milhões de lares. E os investimentos prosseguem no embalo do segundo
mandato do presidente Barack Obama, que na terça-feira “gorda”, enquanto os
foliões se esbaldavam no último dia de carnaval por aqui, renovava seus compromissos
em favor de novas fontes de energia no tradicional discurso Estado da União, no
Congresso americano. Obama propôs uma nova legislação para reduzir ainda mais
as emissões de gases estufa, sugeriu a criação de um fundo que financie o
desenvolvimento de novas tecnologias para carros e caminhões, “para que eles
deixem de usar petróleo para sempre” e lançou como meta para os próximos vinte
anos cortar pela metade o desperdício de energia nas casas e empresas
americanas.
Do outro lado do Oceano Atlântico, no velho continente, os espanhóis iniciaram
o ano batendo um novo recorde de produção de energia eólica (em 16/1) com mais
de 345 mil MWh em um único dia. De acordo com as autoridades locais, a marca
equivale a quase 40% de toda geração de energia no país naquela data, incluindo
todas as demais fontes renováveis, nuclear e fósseis. O vento dominou a matriz
energética durante mais de dez horas, superando neste período os 14 mil
MW.
Na Austrália, maior exportador mundial de carvão (onde este recurso é
abundante), a produção de energia eólica já se tornou mais barata que a gerada
por termelétricas a carvão ou gás. Segundo o diretor da Bloomberg New Energy
Finance (BNEF), Michael Liebreich “a energia limpa é um agente de transformação
que promete virar de cabeça para baixo a economia dos sistemas de
energia”.
Outro
país que também festejou muito os resultados de 2012 foi a Alemanha. No ano
passado, o país registrou um aumento de 45% na produção de energia solar,
recorde histórico. Graças à instalação de mais 1,3 milhão de sistemas
fotovoltaicos, 8 milhões de residências foram abastecidas com energia solar
naquele país. O diretor da Associação da Indústria Solar da Alemanha afirmou
que os investimentos no setor quadruplicaram nos últimos três anos. Com a
produção em escala, o preço das placas fotovoltaicas caiu pela metade. Merece
registro o fato de que a Alemanha é um país com muito menos radiação solar do
que o Brasil.
Falando em Brasil, avançamos na expansão da energia eólica em nossa matriz
energética (o número de pessoas beneficiadas pela energia do vento no país é de
aproximadamente 12 milhões) e no crescimento dos coletores solares para aquecer
a água do banho (já são mais de 2,5 milhões de coletores instalados). Mas não
há ainda política definida para a produção de energia elétrica a partir do sol.
Fala-se abertamente no governo na inclusão das térmicas a óleo, carvão e gás
(hoje acionadas apenas em períodos de forte estiagem) na matriz energética.
Também se discute a construção de novas usinas nucleares, a exploração do gás
de xisto e, por fim, a construção de novas hidrelétricas em áreas de floresta
na Amazônia.
Se
temos em nosso favor o privilégio de poder realizar escolhas (na maioria dos
países o cardápio de opções energéticas é bem mais restrito que aqui), importa
agir com inteligência, visão de longo prazo, e considerar as novas diretrizes
que regem os investimentos globaisem energia. Emresumo: fontes fósseis (ainda
muito importantes e prevalentes no mundo) perdem progressivamente prestígio e
importância (o Brasil do pré-sal é uma das exceções). E pela velocidade com que
os países desenvolvidos investem em inovação tecnológica na direção de fontes
mais limpas, a “descarbonização” da matriz energética parece ser o norte
magnético da bússola. Certo é que as escolhas que o Brasil fizer nos próximos
anos serão determinantes para a maior ou menor inteligência de todo o sistema
elétrico do país para além do século XXI.
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